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A laicidade do rosto humano. 2ª. Parte: Uma religiosidade que resgata a razão e a natureza humana

Stefano Fontana

Stefano Fontana, filósofo, é diretor do Observatório Van Thuân sobre a Doutrina Social da Igreja.
Esse artigo é uma colaboração do

A discussão sobre o Acordo entre o Brasil e a Santa Sé fez ressurgir o debate sobre a questão da laicidade e do Estado laico. Mas não se consegue entender bem essa questão sem considerá-la em suas raízes culturais. Após apresentar a relação entre laicismo e relativismo o autor agora mostra a contribuição de uma sã religiosidade para a construção do bem comum.

Bento XVI nos seus ensinamentos nos propõe um percurso oposto. A primeira coisa a fazer é “alargar a razão”, ou seja, recuperar a possibilidade da razão iluminar não apenas questões científicas, mas também questões éticas,  antropológicas e religiosas. Não vivemos em um mundo feito de acaso, nos afirmou o papa em Regensburg em setembro de 2006 e nós cristãos acreditamos que na origem não está a Irracionalidade mas a Razão criadora. É a mesma fé cristã que pede à razão que amplie o próprio olhar e reencontre confiança em si mesma.
É possível usar a razão para conhecer a lei natural que está inscrita em todo homem e que, como disse São Paulo, a todos se manifesta na luz da sua consciência moral. É possível discernir razoavelmente o bem e o mal e compreender o que diferencia um matrimonio de uma simples convivência, ou mesmo, compreender o erro moral contido em certos comportamentos. A razão me diz que o embrião é pessoa, que a sociedade tem necessidade da família, que o homossexualismo é objetivamente uma desordem.
A lei natural não é uma constrição, mas uma vocação. A minha natureza masculina ou feminina porta um projeto de autenticidade, é a via que me é dada para que eu me torno eu mesmo. O homem não é apenas natureza, nem é só cultura. Ele surge da natureza, mas dela é livre e em condições de construir a sua vida; mas se quer separar-se completamente da natureza esquece-se de que é um projeto e pretende construir-se com uma liberdade total que se torna absurda e vitima dos seus próprios impulsos e desejos.
A ética e a razão são também fatos razoáveis. Existem éticas e religiões mais ou menos razoáveis. O seu metro de medida é a natureza humana. Nem todas as culturas são iguais, porque algumas respeitam mais que outras a natureza do homem. Do mesmo modo as religiões não são todas iguais.  A natureza humana, conhecível pela razão, é o fim ao qual tendem todas as culturas e se torna também critério de discernimento para a verdade das próprias culturas. O mesmo diga-se para as religiões.
Daí segue que o âmbito público não pode separar-se da ética e da razão, isto é, não pode expulsar as verdades absolutas. A laicidade não é uma neutralidade impossível com relação aos absolutos, pois neste caso  a própria laicidade se proporia como absoluta.
A laicidade, ao contrario, é o espaço das discussões racionais sobre as verdades absolutas, éticas e religiosas. Esta não as exclui nem as acolhe todas indiferentemente. No espaço público não se precisa tirar todos os símbolos religiosos nem coloca-los todos. Se a laicidade usar a razão estará em condições de discernir quais propostas éticas e religiosas são verdadeiramente humanas e quais não são.
Entre uma religião que propõe um relacionamento com Deus de tipo pessoal e uma religião que, ao invés, propõe o relacionamento com Deus como algo despersonalizante, uma espécie de anulação do eu no oceano do nada, qual favorecerá mais ao bem comum? Entre uma religião que propõe a paridade entre homem e mulher e uma que propõe a poligamia, que desvaloriza a dignidade feminina, qual deverá ser considerada melhor ao objetivo de contribuir para o bem comum? As religiões propõem uma salvação no além-vida, mas propõem também uma salvação aqui, têm uma repercução nesta vida. A razão pode agora perguntar-se qual religião desenvolve mais ou menos o bem comum aqui.
Em um famoso diálogo com o filosofo alemão Habermas, Bento XVI disse que o terrorismo fundamentalista mostra que a religião tem necessidade de ser purificada pela razão enquanto o domínio tecnológico sobre a vida humana através da bioengenharia mostra que a razão tem a necessidade de ser purificada pela religião. Mas nem todas as religiões atribuem à razão este objetivo, nem todas aceitam se purificar pela razão e nem todas se atribuem o dever de purificar a razão. O cristianismo sim, porque é a religião do Logos. Para os cristãos Deus é Amor e Verdade.
Os cristãos devem recuperar a verdade da razão e ao mesmo tempo a verdade da religião, devem saber que o cristianismo é a religião verdadeira. É uma decorrência de sua identidade, mas também de uma correta laicidade. Se o cristianismo é a religião verdadeira, não pode deixar de ter um papel público e não apenas privado. Os cristãos, em sua missão, não podem deixar de anunciar o próprio cristianismo, devem praticar também uma caridade intelectual, que implica em dar razões de sua fé.
O cristianismo não pode ser reduzido a uma seita entre as tantas encontradas em um grande supermercado religioso.. Anunciar a pretensão cristã de que apenas em Cristo existe salvação – também no sentido terreno e de fato a Rerum novarum diz que não existem soluções para as questões sociais fora do Evangelho - não  é uma forma de violência e intolerância no encontro com os outros. Seria uma violência se a laicidade fosse o âmbito do relativo. Mas, pelo contrário, é a laicidade mesma que tem necessidade daquele anúncio, sem o qual se torna mais difícil chegar ao bem comum. A verdadeira laicidade tem necessidade da transcendência e tem necessidade do cristianismo

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