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A construção da paz a partir de relações fraternas na grande cidade: PARTE II. O caminho da acolhida

Texto apresentado no Seminário Fraternidade & Segurança Pública, promovido pela Revista Cidade Nova, dentro das atividades da Campanha da Fraternidade, na UNIFAI, São Paulo, em 7 de março de 2009.
Francisco Borba Ribeiro Neto

FRANCISCO BORBA RIBEIRO NETO, sociólogo e biólogo, é coordenador de projetos do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

A grande contribuição que cada um de nós pode dar, para construir uma sociedade mais justa, mais segura e menos violenta, é construir espaços capazes de acolher a pessoa humana em todas as suas dimensões.

Um processo de construção da paz, de superação da situação de insegurança atual, implica na construção de relações fraternas capazes de gerar uma realidade de acolhida integral à pessoa humana – que a considere em seus aspectos materiais, psíquicos e espirituais PARTE I. Uma visão integral de pessoa
O combate às agruras e aos sofrimentos nascidos da pobreza é sem dúvida a grande missão à qual somos todos chamados na sociedade brasileira. Trata-se da face mais imediata do problema, a primeira a ser enfrentada. Mas não basta enfrentar a pobreza, sem oferecer uma resposta também às demais dimensões da pessoa humana, a psíquica e a espiritual. Por isso, a construção dessas relações fraternas não pode ser reduzida nem a um assistencialismo, nem a uma militância supostamente transformadora, mas que não responde a todos esses aspectos da pessoa.

Esse processo, na tradição da Igreja, costuma ser chamado de “construção de um povo”. A expressão “povo” costuma ser entendida como uma designação genérica para o conjunto de pessoas que habita um país, ou para designar uma unidade étnica específica. O cristianismo, contudo, trouxe em si outra imagem de povo: a unidade de pessoas que compartilham um mesmo sentido para a vida e que, em nome desse sentido único para a vida, se propõem a superar as divisões sociais, raciais ou nacionais que as separam. Assim, poderíamos terminar a nossa reflexão dizendo que construir a paz implica em construir (ou reconstruir) um povo, com as contradições que caracterizam toda empreitada humana, mas com uma certeza que nasce de já ter encontrado esse sentido para a vida.

Mas, esse pode parecer um discurso teórico e abstrato, se não nos voltarmos para aspectos concretos e práticos desse grande trabalho. Gostaria de enumerar alguns aspectos mais práticos disso que já dissemos anteriormente:

1) Compreender que cada pequena obra, que cada trabalho social, que cada ação solidária, faz parte desse processo de construção de um povo e de reafirmação – num mundo marcado pelo individualismo e pelo niilismo – de que a vida tem um sentido, e que esse sentido é solidário. Isso é particularmente importante numa sociedade fragmentada e particularizada, onde as ações pessoais freqüentemente perdem sua referência global.

2) Não descuidar do aspecto educativa de cada gesto. A educação não é apenas um processo de treinamento profissional, como muitas vezes pensamos, mas um processo de abertura para a realidade. Em cada gesto que fazemos verificamos, mesmo que inconscientemente, a força do sentido que damos a nossa vida. Essa verificação deve ser cada vez mais consciente e explicita, para gerar uma certeza de que se fez as opções certas, que a própria liberdade está engajada num caminho justo – isso é, num caminho que constrói a nossa felicidade.

3) Procurar trabalhar sempre em redes solidárias, onde as iniciativas não precisam – nem devem – estar submetidas a uma direção central, que acaba instrumentalizando-as num processo de luta pelo poder, mas devem estar sempre procurando se ajudar, compreender juntas o sentido de suas ações e do contexto que as cerca.

4) Valorizar, com uma postura realista e sem ingenuidade, no interior dessas redes, as iniciativas que ajudem a construir uma sociedade mais segura e menos violenta.

5) Uma preocupação especial deve ser dedicada à realidade carcerária. Deve-se compreender que a maior parte dos detentos não é formada pelos grandes senhores do tráfico, tão noticiados pela imprensa, mas é pobre e padece as maiores humilhações e sofrimentos em nossas prisões. É vital lutar para que as prisões deixem de ser “escolas do crime” e centro de aliciamento de novos criminosos. Isso não acontecerá, porém, aumentando o rigor do sistema e o sofrimento dos detentos, mas sim crinado – também aí – condições de uma verdadeira acolhida à pessoa humana.

6) Compreender os limites da justiça e a força do perdão e da esperança. Queremos justiça. Mas, se a justiça for bem aplicada, o máximo que parece poder garantir é que o criminoso não voltará mais a realizar o crime. Isso já é muito, mas ainda é pouco. Não resolve o vazio que está em nós. Aquele pedaço de humanidade, de sentido e de esperança, que nos foi arrancado quando tomamos consciência do crime continua ali faltando, clamando por alguma coisa mais, por uma outra justiça que transcenda nossos limites. Queremos uma outra justiça, que recupere o que foi perdido. Mas isso parece impossível... Só o perdão e a esperança podem nos trazer justiça, só eles podem – de alguma forma – recompor uma parte dessa humanidade desfigurada que nos resta depois da tragédia. É a lição que foi dada, por exemplo, por Massataka Ota, o pai do menino assassinado Ives Ota, que passou a dedicar-se a trabalhar com meninos carentes e – surpresa! – criminosos condenados como os que mataram seu filho. É bom lembrar que perdão não significa impunidade, mas sim que a justiça é praticada visando o bem de todos e não a vingança.

7) Por último, trabalhar conscientes de que essas coisas não podem ser vividas e transmitidas como idéias, elas dependem do encontro com experiências concretas, com pessoas que já tem a vida mudada a partir delas – daquilo que a Igreja chama de “testemunhas”. É o rosto dessas testemunhas, são as relações fraternas que nascem do encontro com elas, que permitem que essas palavras não se tornem moralistas ou abstratas.

 

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