Ao recobrir com parafina o piso das Indústrias Matarazzo, num círculo de cerca de 5 m de diâmetro, Flávia Ribeiro está de certo modo criando um sítio arqueológico. A referência são os procedimentos classificatórios do cientificismo clássico: "reliquiae en capsela" (vestígios encapsulados) remete à conservação in vitro de espécies naturais que caracterizou o conhecimento deste período.

Essa película incrustada no piso envolve vestígios (plantas, detritos) e inscrições deixadas no local. Material que não se mistura, a parafina presta-se a embalsamar e preservar as coisas. Uma suave velatura que conserva as marcas da passagem por ali. No tanque ao lado, Flávia Ribeiro cobriu a água com folhas de ouro, criando uma pele capaz de incorporar e sinalizar as marcas deixadas pela exposição ao tempo. Tal como a parafina, uma superfície lisa em contraste com a rugosidade dos escombros. O ouro remete à luz, como a parafina é translúcida, tensionando com a opacidade mortiça da ruína. Como se esses lugares, assim preservados, pudessem um dia renascer, como se essa alquimia pudesse conduzir à transformação de todas as coisas.