Crescimento Pentecostal no Brasil: fatores internos

Ricardo Mariano[*] []

Resumo

Este artigo analisa alguns dos principais fatores da expansão pentecostal no Brasil. Mostra que ela ocorre numa situação religiosa pluralista e de mercado e num contexto socioeconômico caracterizado por grande vulnerabilidade social, pobreza, desigualdade, violência e criminalidade. Destaca, no Pentecostalismo brasileiro, a tendência de concentração de poder eclesiástico, a gestão em moldes empresariais, a eficácia proselitista do evangelismo eletrônico, a formação acelerada de pastores, a militância religiosa dos leigos, a continuidade cultural com a religiosidade popular, a oferta sistemática de serviços mágico-religiosos.

Palavras-chave: Pentecostalismo, crescimento pentecostal, mercado religioso, Brasil

Abstract

This paper analyses some of the most important factors of Pentecostal expansion in Brazil. It shows that it occurs in a market and pluralist religious context and in a socioeconomic context characterized by great social vulnerability, poverty, inequality, violence and criminality. The paper detaches, in the Brazilian Pentecostalism, the tendency of concentration of ecclesiastic power, the management in entrepreneurial models, the efficacy of electronic evangelic proselytism, the accelerated formation of clerics, the activism of laics, the cultural proximity to popular religiosity, and the systematic offer of magic-religious services.

Keywords: pentecostalism, pentecostal growth, religious market, Brazil

Este artigo tem por objetivo analisar, sucintamente, alguns dos principais fatores empíricos do crescimento pentecostal no Brasil, que se acelera a partir da segunda metade do século XX, num contexto de liberdade, tolerância, pluralismo e concorrência religiosos, propiciado inicialmente pela separação jurídica entre Igreja e Estado e consolidado posteriormente pelas transformações modernizantes pelas quais o país passou nesse período. Para compreender sua expansão, prioriza a análise de fatores internos ao Pentecostalismo brasileiro, tais como a dimensão organizacional (concentração do poder eclesiástico e das finanças, gestão empresarial), a formação rápida e acelerada de novos pastores, arrecadação agressiva de recursos e seu crescente investimento no evangelismo eletrônico e na abertura de novas congregações e campos missionários, a continuidade cultural com a religiosidade popular, a oferta sistemática de cultos e serviços mágico-religiosos. Refere-se, em sua maior parte, às maiores denominações pentecostais do país, em especial as que apresentam maior crescimento.

Desde os anos 50, o Pentecostalismo cresce muito no Brasil. Mas sua expansão acelera-se acentuadamente a partir da década de 1980, momento em que esse movimento religioso passa a conquistar igualmente crescente visibilidade pública, espaço na tevê e poder político partidário. Segundo os Censos Demográficos do IBGE, havia 3,9 milhões de pentecostais no Brasil em 1980, 8,8 milhões em 1991 e 17,7 milhões em 2000.

Os dados mais recentes sobre religião no Brasil foram produzidos pelo Instituto Datafolha e divulgados, em 6 de setembro de 2007, pela Folha de S. Paulo: os católicos caíram para 64%, enquanto o conjunto dos evangélicos subiu para 22% da população, sendo 17% deles pentecostais e 5% protestantes[1]. Foram mantidas, portanto, as principais tendências dos decênios anteriores: forte declínio católico e elevada expansão pentecostal. Agora, já são mais de 40 milhões de evangélicos presentes no país, dentre os quais cerca de 30 milhões são pentecostais. Isso faz do Brasil o país com o maior número de pentecostais do mundo. Para dar ideia do êxito expansionista desses religiosos, basta observar que os Estados Unidos, onde o Pentecostalismo teve origem, tinha apenas 5,8 milhões de adeptos em 2006, segundo pesquisa do Pew Research Center.

Há centenas de diferentes denominações pentecostais no país. Dada a diversidade institucional e a pluralidade interna desse movimento religioso, não é despropositado falar em pentecostalismos, no plural. Pois, além da presença de elevado número de igrejas existentes e concorrentes, há grande variação doutrinária, ritual, litúrgica, organizacional (governo eclesiástico), comportamental e estética e nesse meio religioso. Variam igualmente suas estratégias proselitistas, seus públicos-alvo, sua relação com os poderes públicos, com a política partidária e com os meios de comunicação de massa. Em suma, trata-se de um fenômeno religioso dinâmico e internamente muito diversificado.

Apesar da diversidade denominacional nesse meio religioso, observa-se que, com base nos dados do Censo Demográfico de 2000, cinco igrejas concentram nada menos que 85% dos pentecostais do país: Assembleia de Deus (8.418.154 adeptos), Congregação Cristã no Brasil (2.489.079), Igreja Universal do Reino de Deus (2.101.884), Igreja do Evangelho Quadrangular (1.318.812) e Igreja Pentecostal Deus é Amor (774.827). Em 2000, a Assembleia de Deus sozinha, já quase centenária e dividida em várias denominações, concentrava quase a metade dos pentecostais brasileiros (47,5%).

Elas crescem em ritmos desiguais. Por ordem decrescente, as cinco denominações apresentaram as seguintes taxas médias de crescimento anual entre 1991 e 2000: Igreja Universal (25,7%), Deus é Amor (18,4%), Evangelho Quadrangular (17,7%), Assembleia de Deus (14,8%) e Congregação Cristã no Brasil (4,8%). A Universal obteve, disparado, o maior êxito numérico neste período, ao passo que a Congregação Cristã, a primeira igreja pentecostal fundada no país, ficou na lanterna, com performance bem inferior a das demais.

Entre 1980 e 1991, a taxa de crescimento anual dos pentecostais foi de 7,1%. Entre 1991 e 2000, chegou a 8,3%, o que representa uma expansão quatro vezes maior que a da população brasileira no período. Mas sua expansão conversionista enfrenta barreiras de classe. A classe média mais escolarizada, por exemplo, resiste ao tradicional sectarismo, moralismo e ascetismo contracultural das agremiações pentecostais. As igrejas que reduziram e flexibilizaram, por princípio ou estratégia, suas exigências comportamentais, tais como Renascer em Cristo, Sara Nossa Terra e Bola de Neve, conseguiram conquistar segmentos de classe média. Contudo, mantiveram-se relativamente pequenas. Não se tornaram igrejas de massa, nem parecem deter potencial para tanto. Nesse sentido, tal êxito foi alcançado apenas por denominações que priorizaram o proselitismo dos estratos pobres da população, orientação que caracteriza as que ocupam o topo do ranking nacional. De modo que o Pentecostalismo cresce, sobretudo, na pobreza e na periferia das regiões metropolitanas. Seus fiéis concentram-se majoritariamente na base da pirâmide socioeconômica. Comparados à média da população brasileira, os pentecostais congregam mais mulheres do que homens, mais crianças e adolescentes do que adultos, mais negros, pardos e indígenas do que brancos, apresentam maior proporção de pessoas com cursos de alfabetização de adultos, antigo primário e primeiro grau, ocupam mais empregos domésticos e precários e, em sua maioria, recebem até três salários mínimos[2].

Dadas as barreiras de classe – só mui parcialmente e a duras penas superadas – e a relação figadal entre Pentecostalismo e pobreza na atualidade, deduz-se que a expansão pentecostal poderá desacelerar nas próximas décadas, se ocorrer acentuada melhoria nos indicadores sociais, nas taxas de escolarização e nas condições de vida da população. No momento, contudo, os altos índices de pobreza, desemprego, desigualdade social, criminalidade, violência, precariedade e informalidade no mercado de trabalho tornam o Brasil terreno extremamente fértil para a prédica pentecostal. Tal contexto socioeconômico, porém, não é o responsável por seu sucesso. A vulnerabilidade e o desespero de grandes contingentes populacionais, em especial das mulheres pobres e mais ainda das negras pobres, vítimas de discriminações de gênero e raça, sem dúvida facilitam seu trabalho e ampliam sua probabilidade de êxito. Mas seu sucesso proselitista não depende da existência de tais problemas em si mesmos, e, sim, justamente de sua elevada capacidade de explorá-los, oferecendo recursos simbólicos e comunitários para seus fiéis e potenciais adeptos lidarem com eles.

A dimensão organizacional: concentração do poder eclesiástico e gestão empresarial

Segundo Peter Berger (1985: 150), a situação pluralista e de mercado estimula a racionalização e burocratização das estruturas denominacionais, resultando na profissionalização de seus quadros eclesiásticos e administrativos. Nos meios pentecostais, o protótipo de tal racionalização foi percebido já no final dos anos 70, quando Duglas Monteiro (1979) interpretou os grupos responsáveis pela realização de duas concentrações pentecostais de cura divina como agências dotadas de corpo burocrático e de estrutura semi-empresarial, tendentes a “organizar-se enquanto empresas destinadas à produção e distribuição de bens e de serviços religiosos”. Com isso, tais grupos religiosos principiavam a ser “administrados segundo normas empresariais da organização capitalista” (ALVES 1978: 136-138). Os autores apontam a emergência da transformação de seitas pentecostais em empresas produtoras de bens de salvação, geridas segundo a lógica do mercado. Desde então, esse fenômeno recrudesceu. Tanto que as denominações pentecostais que mais crescem no país, como Igreja Universal e Deus é Amor, concentram o poder eclesiástico, centralizam a administração e os recursos financeiros e adotam modelo de gestão em moldes empresariais. Nas últimas décadas, a lógica de mercado tornou-se cada vez mais presente nesse meio religioso, promovendo a concentração do poder através da adoção de gestão centralizada e do estabelecimento de governos eclesiásticos episcopais, comandados verticalmente por bispos, missionários, apóstolos e profetas[3].

Nos anos 90, ao refletirem sobre o estrondoso crescimento da Igreja Universal, os pesquisadores atentaram de vez para o modelo empresarial de gestão (ORO 1992), para as estratégias de marketing (Fonseca 1997; Campos 1996), para a estruturação da igreja como “negócio” (Prandi 1996) e para a concepção e inovação da “igreja como empresa econômica e a religião como fonte de lucro e enriquecimento pessoal” (Pierucci 1996: 282). Nesse período surgiram, inclusive, líderes pentecostais tratando abertamente da gestão empresarial e do uso de estratégias de marketing. Na apostila A igreja usando o marketing como arma espiritual, baseada nas teorias de Phillip Kotler, o líder da Renascer em Cristo, apóstolo Estevam Hernandes Filho, ex-gerente de marketing da Xerox do Brasil e da Itautec, afirma que, no plano organizacional e administrativo, sua igreja deve ser encarada como uma empresa no mercado.

A Igreja Universal, sem dúvida, é o caso pentecostal mais emblemático da opção denominacional pelas estratégias de mercado e o mais bem-sucedido. Para granjear tamanho sucesso religioso, financeiro, patrimonial, midiático e político, conta com governo eclesiástico verticalizado, gestão de tipo empresarial, quadros eclesiástico e administrativo profissionalizados, adota estratégias de marketing, estabelece metas de produtividade para os pastores, provê seus fiéis e clientes de oferta sistemática de serviços mágico-religiosos, possui grande disciplina eleitoral (para eleger suas bancadas políticas), arrecada recursos com eficiência e os investe no evangelismo eletrônico, em empresas de comunicação (gravadora, editora, redes de rádio e TV), na contratação de pastores, na abertura de novas congregações e de novos campos missionários.

Diferentemente do que se passa na maioria das igrejas evangélicas e pentecostais, os pastores da Universal trabalham para a igreja em período integral, ou em regime de dedicação exclusiva, o que constitui extraordinária vantagem competitiva. Por isso, enquanto suas principais concorrentes no campo pentecostal realizam cerca de meia dúzia de cultos públicos por semana, os templos da Universal abrem religiosamente todos os dias para a realização de quatro a cinco cultos diários.

O governo eclesiástico verticalizado, por sua vez, dinamiza o processo decisório, dado que as deliberações dos líderes prescindem da anuência do baixo clero, pago para se incumbir da execução imediata das ordens superiores. Ao não ter de passar por morosos trâmites em diversas instâncias decisórias e deliberativas, próprias de igrejas dirigidas por governos eclesiásticos mais democráticos, as decisões religiosas, administrativas, organizacionais e evangelísticas dos líderes tendem a ser repassadas mais rapidamente aos pastores, obreiros e militantes leigos, agilizando a realização dos trabalhos. Tamanho poder eclesiástico permite à liderança centralizar a administração da totalidade dos recursos da denominação. Tal concentração financeira permite bancar investimentos estratégicos para a expansão da igreja, como, por exemplo, a aquisição de emissoras de rádio e TV, o estabelecimento de novas frentes de evangelização e a construção de templos de grande porte.

Frequentemente, a gestão em moldes empresariais está associada a governos presididos por líderes carismáticos, o que não é garantia de sucesso. Haja vista que um líder pentecostal pode ser carismático, deter enorme poder sobre os fiéis, ostentar muitos dons espirituais, mas liderar não mais que uma pequena congregação na periferia urbana. A liderança carismática do fundador contribui para o crescimento denominacional somente quando obtém êxito em unir e motivar bispos, pastores, presbíteros, diáconos, obreiros e fiéis a colaborar, trabalhar e empenhar-se ao máximo para atingir as metas expansionistas propostas. Mas tais atitudes podem ser obtidas, e de forma constante e institucionalizada, por meio do exercício do poder eclesiástico, da administração burocrática e da gestão profissional de pessoal. Conquanto se destaque o papel da liderança eclesiástica e pastoral, cumpre observar que o ativismo religioso dos leigos, comum nos meios pentecostais, constitui fator de grande importância para a expansão denominacional.

Geralmente, se pensa que o governo congregacional da Assembleia de Deus, criado por suecos de extração batista, concede elevada autonomia às congregações locais. Haja vista que o modelo de governo congregacional é descentralizado, democrático e faculta autonomia religiosa e administrativa às lideranças e comunidades locais. No caso da Assembleia de Deus, porém, suas lideranças ministeriais tendem a exercer o poder como “bispos e pequenos papas” (WILLEMS 1967: 119). Por um lado, é fato que a Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) e a Convenção Nacional das Assembleias de Deus (CONAMAD), entidades que dirigem as duas principais denominações assembleianas do país, nem de longe conseguem concentrar o poder tal como a Universal. Seu comando se acha pulverizado nas mãos de diversos pastores presidentes de ministérios. Por outro lado, contudo, tais pastores presidentes procuram concentrar o poder clerical e centralizar a administração das congregações sob sua jurisdição. Basta observar que o Ministério do Belém, em São Paulo, presidido pelo pastor José Wellington Bezerra da Costa, supostamente controla mais de mil congregações na capital paulista. Em 2000, Costa explicou que as congregações paulistas da Assembleia estão vinculadas à igreja-sede, que centraliza sua administração e concentra toda a sua renda (Eclésia, 51, fev./2000). Esse modelo de gestão centralizador limita acentuadamente a autonomia das congregações locais. Já o presidente da CONAMAD, Manoel Ferreira, tornou-se vitalício no cargo em meados de 2001, quando se autoproclamou bispo. Eis indícios claros de concentração de poder eclesiástico, mas que, nos casos em questão, não derivam, necessariamente, da adoção de estratégias de mercado, e, sim, de um tradicional modelo mandonista de exercício do poder.

Ao enfatizar a adoção de gestão empresarial, de estratégias de marketing, não se está afirmando que a lógica de mercado se impôs ou que se imporá inevitavelmente sobre as denominações pentecostais. Até porque diversas lideranças pentecostais rejeitam a hipótese de fazer concessões mercadológicas para dilatar o sucesso numérico de suas igrejas. Isso ocorre, por exemplo, com a Congregação Cristã no Brasil, cujos líderes preferem se manter fiéis a princípios bíblicos e a tradições que norteiam sua missão religiosa, a maioria incompatível com certas ações e estratégias de mercado usuais na Igreja Universal e noutras denominações. Muitas delas são vistas como reconhecidamente eficazes para atrair e recrutar adeptos, mas, ao mesmo tempo, são rejeitadas como antiéticas e antibíblicas.

Arrecadação e proselitismo eletrônico

A arrecadação financeira – quando aplicada no evangelismo eletrônico, no trabalho missionário, na manutenção de extensa rede de pastores e na aquisição de novos locais de culto – constitui fator crucial para a expansão denominacional. Pois, quem arrecada mais pode investir mais que as concorrentes no evangelismo eletrônico, na ampliação de sua presença eletrônica e geográfica e de seu número de pontos de pregação, de congregações e de templos, dilatando a capacidade de sua oferta religiosa atingir um público mais amplo e, com isso, criar novas demandas e clientelas.

A Teologia da Prosperidade, que promete prosperidade, felicidade e vitória terrenas, é o carro-chefe da estratégia arrecadadora da Universal, a denominação pentecostal mais eficiente na coleta de recursos financeiros no Brasil[4]. A pesquisa Novo Nascimento, realizada no Grande Rio em meados dos anos 90, perguntou aos fiéis sobre a contribuição financeira efetuada num determinado mês de 1994. Descobriu que, embora tivessem renda semelhante, os adeptos da Universal contribuíam mais e em maior número do que os da Assembleia de Deus: 27% dos seguidores de Macedo fizeram doações que ultrapassaram o valor do dízimo contra apenas 14% dos assembleianos; 17% dos primeiros doaram quantias menores que o dízimo contra 25% da Assembleia; 24% dos iurdianos não fizeram contribuição alguma contra 33% dos últimos; houve empate apenas entre os que contribuíram valor equivalente ao dízimo: 24% e 23%, respectivamente (FERNANDES, 1996). Dentre fiéis de todas as igrejas pesquisadas, os da Universal foram os que mais contribuíram com valores acima do dízimo, os que menos fizeram doações inferiores ao dízimo e os que menos deixaram de contribuir. Dos crentes cuja renda não ultrapassava dois salários mínimos, os da Universal foram os que mais doaram quantias superiores à décima parte de sua renda: 35% contra 20% da média dos evangélicos (FERNANDES 1996: 39).

O evangelismo midiático em rádio e tevê constitui o mais poderoso meio para atrair e recrutar rapidamente elevado número de adeptos. Por sua inigualável capacidade de introduzir-se diariamente nos lares, o evangelismo eletrônico apresenta a vantagem de alcançar aqueles que, antes de serem atraídos e recrutados por determinada igreja, não possuíam relação de confiança, amizade e parentesco com crentes pentecostais, laços de sociabilidade tradicionalmente importantes para o recrutamento de novos adeptos. Pesquisa realizada no Rio de Janeiro revela que mais da metade dos “atingidos pela mídia” evangélica não tinha vínculos familiares com evangélicos (FONSECA 1997: 188). Daí o entusiasmo dos pregadores eletrônicos pelo evangelismo no rádio e na tevê. Caso da Renascer em Cristo, por exemplo: “Mais de 60% dos novos convertidos”, afirma Estevam Hernandes, “vêm aos cultos através da mídia eletrônica” (Vinde, 13.11.1996).

Em geral, as lideranças pentecostais preferem o rádio à TV. São pelo menos três as razões para a predileção: o menor preço de locação ou de compra das emissoras, seu baixo custo de manutenção e sua elevada audiência entre os estratos mais pobres da população. Além de demandar maior custo financeiro, o televangelismo, segundo Fonseca (1997), resulta em benefício proselista inferior ao proporcionado pelo radioevangelismo. Ao contrário do que geralmente se supõe, a Universal prioriza o uso proselitista do rádio. Sua poderosa rede de tevê funciona de forma eminentemente comercial, reservando preferencialmente no período da madrugada para a programação religiosa e, em menor proporção, em horários diurnos. No rádio, transmite testemunhos e promessas de bênçãos, exibe canções de cantores e bandas evangélicos e mensagens pastorais e incessantes convites aos ouvintes para comparecer a seus cultos e campanhas. Mediante survey realizado no Rio de Janeiro, Fonseca (1997: 190) constatou que para 50,3% dos adeptos da Universal sua conversão foi influenciada por rádio (32%) e TV (18,3%). Em ambos os veículos de comunicação a Universal confere destaque à transmissão de testemunhos de bênçãos, considerados extremamente eficazes na atração de potenciais adeptos.

Apesar da eficácia do evangelismo midiático, deve-se atentar para o fato de que seu papel não é a conversão. Sua principal função é atrair, em maior ou menor número, indivíduos aos templos e auxiliar na implantação de novas congregações. É no interior dos templos e congregações que a pregação pentecostal se torna plausível, isto é, cria as condições propícias para romper os ceticismos e barreiras do virtual adepto e, assim, possibilitar que ele se entregue a Jesus, mude de religião e permaneça na comunidade dos eleitos. Seja nos casos em que atuam familiares, amigos, vizinhos, colegas de escola ou trabalho, seja naqueles em que mídia eletrônica, literatura, pregações em K7 ou em vídeo, CDs e shows de música gospel atraem os potenciais adeptos, as relações interpessoais são cruciais na adesão e, em especial, no processo de conversão à igreja. Daí a preocupação em recepcionar da melhor forma possível os recém-chegados que não possuem contato pessoal prévio com outros crentes, orientando-os e, em muitos casos, inserindo-os em grupos menores e mais íntimos, seja na própria igreja – caso dos grupos de adolescentes, jovens, solteiros, casados, senhoras, por exemplo –, seja em núcleos de fiéis que se reúnem na residência de um de seus membros. As igrejas dotadas majoritariamente de médios e grandes templos dependem fortemente desses grupos para discipular os recém-chegados e induzi-los a criar vínculos pessoais e afetivos com outros fiéis, laços associativos cruciais para motivá-los a permanecer no grupo religioso.

Os dividendos do proselitismo eletrônico dependem, porém, de quão atraente é a mensagem veiculada e da potência da emissora de rádio ou tevê utilizada. Os programas religiosos que mais atraem pessoas às igrejas são os que destacam o poder transformador de Deus na vida dos homens, centrados na exibição de testemunhos de curas, milagres, intervenções e bênçãos divinas de toda espécie. Em contraste, mostram-se pouco eficazes os que enfatizam o ensino doutrinário, transmitem sermões e discussões teológicas. Da mesma forma, o proselitismo eletrônico produz melhores resultados quando procura atrair ouvintes e telespectadores para os templos, locais onde eles efetivamente podem ser persuadidos, por exemplo, de que precisam ser libertos dos poderes demoníacos, de que necessitam ter um encontro com Cristo e de que devem obedecer a Deus e permanecer na igreja como condição para obter bênçãos materiais e assegurar sua salvação.

O líder da Deus é Amor, missionário David Miranda, rejeita o televangelismo, proíbe seus fiéis de possuir aparelhos de tevê e de assisti-la. O rádio é seu principal instrumento de evangelização. Enquanto seus cultos enfatizam os dons de cura e revelação e os rituais de libertação de demônios, A Voz da Libertação, programa oficial da igreja, prioriza a exibição de testemunhos. Decisão estatutária de 1975 veda a “pregação do evangelho no programa A Voz da Libertação” e recomenda a transmissão de testemunhos, que, na opinião dos dirigentes da denominação, constitui o recurso mais eficaz para “chamar a atenção dos pecadores” e trazê-los “para ouvir as mensagens na igreja”. Em 1981, em nova resolução sobre o assunto, a diretoria da igreja determinou que a exibição de testemunhos de bênçãos e curas deveria ocupar entre 60% e 70% do referido programa, destacando sua eficácia proselitista para justificar tal decisão. O estatuto assevera: “Tendo em vista ser a nossa Igreja uma obra evangelística, e o principal objetivo é ganhar almas para o reino de nosso Senhor Jesus Cristo, já ficou mais do que provado que a melhor maneira de trazer o povo Católico Espírita e o pecador para a Igreja é através dos testemunhos de bênçãos e curas”.

Antes dos anos 1950, era enorme a resistência sectária das igrejas pentecostais presentes no país ao uso do rádio. Só nas últimas décadas é que a Assembleia de Deus passou a valorar positivamente e a adotar o evangelismo eletrônico. Atualmente, possui, inclusive, uma rede de rádio e televisão, a Rede Boas Novas (RBN), na região Norte, fruto da iniciativa de um líder local. E o líder da Convenção Geral das Assembleias de Deus realiza programa na tevê. Suas divisões internas em dezenas de convenções estaduais e em múltiplos ministérios independentes, porém, limitam suas chances de competir nessa área com a Universal. Apesar de defasada em relação às ações e estratégias midiáticas das igrejas neopentecostais, a Assembleia, a muito custo, vem procurando se adaptar às pressões e vicissitudes do mercado religioso, fazendo algumas concessões, alterando práticas tradicionais.

O mesmo não se verifica com a Congregação Cristã, que constitui um caso à parte no campo pentecostal. Por conta de sua doutrina portadora de traços calvinistas e de seus acentuados tradicionalismo e sectarismo, rejeita o uso da mídia eletrônica e qualquer recurso proselitista que não seja o evangelismo pessoal. Este, contudo, não é efetuado de casa em casa, no transporte público, nem em praças, hospitais, penitenciárias. Seu evangelismo se limita, em grande parte, à socialização religiosa da prole, ao testemunho de bênçãos e ao convite para assistir aos cultos e ao ritual de batismo nas águas nos templos, ocasião em que os anciãos (como são nomeados seus pastores) aproveitam para fazer insistentes apelos visando persuadir os presentes a tomarem a decisão de se deixar batizar, alardeando que aquela pode ser a última oportunidade do visitante para se entregar a Jesus antes do Juízo Final. A invisibilidade pública da Congregação Cristã deriva dessa opção exclusiva pelo evangelismo pessoal. Não obstante sua relativa eficácia, tal estilo evangelístico não consegue fazer frente ao proselitismo midiático das igrejas concorrentes. Com isso, como demonstram cabalmente os dados do último Censo Demográfico, ela vem crescendo pouco, perdendo terreno rapidamente.

Um de seus trunfos é que, com exceção do montante destinado à “obra de piedade”, os recursos arrecadados são reservados exclusivamente para o custeio das despesas das congregações (com aluguel, água, luz, telefone, consertos gerais etc.), da compra de novos terrenos e da construção de edificações para instalar novos templos. Tal concentração financeira na manutenção e fundação de congregações só é possível por que a denominação não investe recursos na mídia eletrônica, em gravadoras, editoras, livrarias, literatura, escolas, hospitais, seminários e faculdades teológicos, não remunera seu clero nem dispõe de funcionários pagos. Tal investimento em novas congregações é crucial para a expansão denominacional, mesmo que pequena. Mas é insuficiente para compensar sua completa ausência das diversas mídias e sua excessiva discrição proselitista, fatores que a impedem de reverter sua baixa competitividade no mercado religioso brasileiro atual.

Produção de pastores em larga escala

Willems (1967) e D’Epinay (1970) compartilham o ponto de vista de que o Pentecostalismo democratiza o acesso ao sagrado e à hierarquia eclesiástica, uma vez que crentes pobres e pouco instruídos detêm o direito de exercer dons do Espírito Santo e, mesmo sem formação teológica, de ascender a cargos ministeriais. Contudo, ressalta Rolim (1985: 124), as mulheres são excluídas do pastorado na maioria das igrejas pentecostais, os leigos geralmente não participam da escolha de seus dirigentes, nem das instâncias que os selecionam e nem da definição dos critérios que regulam o acesso aos cargos pastorais. Portanto, é insustentável a perspectiva de que o acesso à hierarquia eclesiástica das igrejas pentecostais é democrático. A dispensa dos candidatos ao pastorado da posse de diplomas teológicos obtidos em seminários e faculdades significa tão-somente que o acesso à hierarquia eclesiástica não é elitista.

O baixo grau de exigência de conhecimento teológico para o ingresso no pastorado deriva, em parte, da forte tradição leiga do Pentecostalismo. Por mais que venha sendo clericalizado, o aprendizado prático para o exercício do pastorado permanece forte, ainda que tenha deixado de ser a regra. Com efeito, isto lhe provê extraordinária vantagem competitiva sobre o Protestantismo histórico e a Igreja Católica. Para se candidatar a pastor na Universal, conforme José Cabral: “Os requisitos são a conversão, a dedicação e o desejo de fazer a obra de Deus. Em alguns estados há um curso especial e intensivo com duração de seis meses, no qual o obreiro é orientado nos princípios básicos do cristianismo e da IURD” (Vinde, n. 10, ago./1996). Exigências simples e nada elitistas – conversão, dedicação e desejo – facilitam a formação de novos pastores e aceleram o ingresso dos candidatos ao pastorado. Segundo pastor Cabral, o aprendizado para o exercício do pastorado ocorre mediante “a atuação prática e direta nas igrejas”. De forma que, para o aspirante a pastor, basta aprender a reproduzir o que os pastores titulares fazem no púlpito. Um dos principais motivos disso se deve à acentuada aversão de Edir Macedo à erudição teológica. Em A Libertação da Teologia, critica severamente o “cristianismo de muita teoria e pouca prática; muita teologia, pouco poder; muitos argumentos, pouca manifestação; muitas palavras, pouca fé” (MACEDO s.d.: 11- 128).

Desprovido de formação teológica formal, o missionário R. R. Soares, líder da Internacional da Graça de Deus, embora considere “muito bom” haver seminários e faculdades, apresenta motivo mais prosaico para não exigir estudo teológico dos pastores sob seu comando. Em sua opinião, “os melhores pastores não saem dos seminários”. A seu ver, “pastor é que nem jogador de futebol. Eles não saem das escolinhas; eles surgem, aparecem. Depois, só precisam ser lapidados” (Eclésia, 67, jun. 2001). Não é, pois, o maior ou menor conhecimento teológico que produz o craque ou o “perna-de-pau” dos púlpitos. O bom pastor é aquele que, no exercício do ministério pastoral, propicia os melhores resultados numéricos (fiéis, batismos, congregações) e financeiros à igreja.

A Universal fornece curso bíblico prático de seis meses para parte de seus novos pastores. Algumas das principais igrejas pentecostais brasileiras, porém, rejeitam qualquer tipo de ensino teológico formal. A Deus é Amor, além de se opor à fundação de seminários, proíbe fiéis, diáconos, presbíteros e pastores de frequentarem cursos bíblicos ou teológicos de outras igrejas e seminários independentes. A desobediência à tal proibição pode acarretar a suspensão da comunhão. Da mesma forma, para que o “Espírito Santo tenha livre ação na igreja”, a Congregação Cristã no Brasil rejeita a instituição de cursos bíblicos para fiéis, cooperadores, diáconos e anciãos[5]. Sua liderança desaprova o formalismo teológico, exortando que a palavra de Deus “não é para ser discutida, porém obedecida”. Pois, além de a Bíblia conter “tudo o que se precisa, individual e coletivamente”, o Espírito Santo fornece “a sabedoria” necessária “para entender o que Deus tem já revelado em sua Santa Palavra”. A escolha das novas lideranças pastorais (diáconos e, no topo hierárquico, anciãos) depende da “revelação divina”, que, no caso, frequentemente promove às funções eclesiásticas fiéis mais antigos, virtuosos e vocacionados.

Até os anos 1970, a hierarquia eclesiástica da Assembleia de Deus se opunha radicalmente à formalização do ensino teológico. Apesar disso, seu primeiro instituto bíblico, o IBAD (Instituto Bíblico das Assembleias de Deus), em Pindamonhangaba, estado de São Paulo, foi fundado em 1960 “contra muita oposição por um brasileiro que havia estudado nos Estados Unidos” (FRESTON 1994: 119). A despeito da oposição interna, a opção pelo ensino teológico formal acabou por superar a ideia de que, para exercer o pastorado, bastava ao candidato a pastor ter fé e estar cheio do Espírito Santo. O surgimento de novas gerações de fiéis mais escolarizadas, o consequente desejo das lideranças eclesiásticas de obter respeitabilidade social e confessional e o crescente intercâmbio entre pastores assembleianos brasileiros e norte-americanos contribuíram para modificar essa situação. Em 1978, a Convenção Geral instituiu a obrigatoriedade de curso bíblico para o pastorado (FRESTON 1993: 73). Desde então, a Assembleia avançou na criação de novos institutos bíblicos, embora em pequena monta. Atualmente, são 27 institutos oficiais. E milhares de aspirantes a pastor realizam cursos teológicos à distância.

A Igreja do Evangelho Quadrangular foi a primeira igreja pentecostal a fundar um instituto teológico no Brasil, em 1957. Não obstante o pioneirismo, só nas últimas décadas sua liderança passou a conferir maior importância à formação teológica de seu corpo eclesiástico. Hoje, já conta com mais de duas centenas de institutos teológicos, a maioria dos quais oferecendo curso básico de um ano, e os demais, curso médio de três anos. Fiel às origens, cerca de 40% dos integrantes de seu ministério são mulheres. O extenso sacerdócio feminino e seu parlamentarismo eclesiástico[6] fazem da Quadrangular a mais democrática das grandes igrejas pentecostais do país.

Ao contrário da Quadrangular, as igrejas Deus é Amor e Congregação Cristã rejeitam o sacerdócio feminino[7]. A 35ª Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, ocorrida em Brasília, em janeiro de 2001, decidiu em sessão plenária a questão do pastorado feminino: “A votação foi rápida e fulminante: rejeitado. De cerca de 2,5 mil ministros aptos para votar, apenas três foram favoráveis” (Mensageiro da Paz, 1-15 fev./2001). Na Igreja Universal, não há proibição à consagração de mulheres ao pastorado, mas não há o menor estímulo para as obreiras seguirem a carreira eclesiástica. As posições que as fiéis ocupam na Universal reproduzem as mesmas assimetrias e desigualdades enfrentadas pelas mulheres na sociedade brasileira (KRAMER 1999: 66).

Cumpre observar que se, nas cinco maiores igrejas pentecostais do país apenas uma abre realmente espaço para o pastorado feminino, as mulheres, mesmo distantes do poder eclesiástico, exercem papel crucial na expansão das igrejas pentecostais. Pois são elas as mais ativas e eficientes na condução de familiares, amigos, colegas e vizinhos às congregações pentecostais (MACHADO 1996).

Em contraste com o que sucede no Pentecostalismo, nas protestantes históricas, o candidato a pastor precisa estudar Teologia em seminário ou faculdade por quatro anos, no mínimo. Além disso, para poder exercer efetivamente a função pastoral, deve antes passar por provas, exames, arguições, tutorias e períodos de observação. São diversas as barreiras acadêmicas e vários os anos a serem ultrapassados para chegar ao pastorado.

[Na Igreja Congregacional] O aluno pode fazer o curso de educação teológica (de nível técnico) ou de bacharelado, para o qual é obrigatório o segundo grau. ‘Após quatro anos de estudo, ainda há o estágio de um ano, monitorado por uma comissão. A ordenação só ocorre depois desse período, e ainda depende de aprovação em prova escrita e numa arguição’, esclarece [Paulo Leite da costa, presidente da União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil]. (...) [A Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil, IECLB] só ordena ao ministério o candidato que tem curso de bacharelado em teologia. Além disso, também exige um período prático de habilitação de um ano. Mais disseminada no sul do país, a IECLB possui um seminário de formação pastoral em São Leopoldo (RS), por onde se graduam de 20 a 30 bacharéis por ano. (...) a trajetória de um candidato a sacerdote luterano é longa e difícil, podendo chegar a mais de cinco anos (...). [Na Igreja Presbiteriana do Brasil] ‘Quem se sente vocacionado para o ministério deve ser examinado primeiramente pelo conselho da igreja local’, explica o reverendo Guilhermino Cunha, presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil. ‘O aspirante é enviado ao Presbitério, e, se aprovado, pode fazer o vestibular para o seminário.’ O curso superior de teologia, ministrado em um dos seis institutos da denominação espalhados pelo Brasil, tem duração de cinco anos, mas só entra quem tem segundo grau completo e é aprovado no exame vestibular específico. Depois de formado, o candidato é novamente examinado pelo Presbitério e, sendo aprovado, inicia um período de licenciatura de um a três anos, durante o qual pode pregar o Evangelho, mas tutorado por um pastor. (...) [Na Igreja Metodista do Brasil] a formação de um pastor metodista tem duas fases: um curso básico, de dois anos, e o de teologia, que dura mais três. Após formado, o teólogo passa por um período de acompanhamento que dura quatro anos, quando é observado por uma comissão ministerial. Somente depois de satisfeitas todas estas etapas – que podem durar até dez anos – é que o candidato é ordenado pastor. (...) [Com mais de mil alunos, o Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, vinculado à Convenção Batista Brasileira, oferece cursos] em três níveis: bacharelado, com duração de quatro anos; mestrado, por um período de três anos; e doutorado, de quatro anos” (Vinde, n. 10, ago./1996)

Nas igrejas protestantes, a demora na formação pastoral e o rigor nas exigências feitas aos candidatos ao pastorado tendem a desestimular as vocações sacerdotais, a reduzir o número de pastores formados nos seminários e faculdades teológicos e, com isso, a diminuir o contingente de pessoas empenhadas em abrir congregações e recrutar adeptos. Portanto, no que concerne aos efeitos dessa prolongada e elitizada formação teológica sobre a expansão denominacional, as igrejas pentecostais levam enorme vantagem sobre as protestantes.

Somente lideranças denominacionais que não têm a expansão numérica como objetivo primordial podem se dar ao luxo de levar até dez anos para formar um pastor e de investir parte considerável de seus recursos materiais e humanos em atividades cujos fins não são evangelísticos. Na história do Protestantismo brasileiro, tal investimento foi destinado, sobretudo, à área de educação. Ao contrário dos batistas, que logo cedo optaram por centrar esforços na evangelização – daí a superioridade de sua expansão no Protestantismo nacional –, metodistas e presbiterianos priorizaram a estratégia de montar colégios para recrutar indivíduos nos estratos de classe média. O ramo metodista avançou ainda mais nesse propósito, investindo muito na criação e manutenção de instituições de ensino superior. Sua expansão numérica continua secundária, subordinada, em parte, à ação educacional e, mais recentemente, à orientação que prioriza seu engajamento na solução de problemas sociais.

As igrejas que investem mais recursos materiais e humanos na implantação de novas congregações tendem a crescer mais do que as que priorizam empreendimentos sem fins proselitistas imediatos, como a construção de escolas e de faculdades e seminários teológicos, opção preferencial de várias igrejas protestantes. Quanto maiores os incentivos para que pastores e lideranças locais, mesmo leigas, criem pontos de pregação e novas congregações, mais acelerado e acentuado tende a ser o crescimento denominacional (WAGNER 1987).

Continuidades entre Pentecostalismo e religiosidade popular

A literatura acadêmica tradicionalmente retrata o Pentecostalismo como formador de seitas, salientando com isso sua ruptura com a cultura, a sociedade e a religiosidade brasileiras. Ao mesmo tempo, seja em contraste ou em concordância com esta perspectiva, diversos pesquisadores vêem o Pentecostalismo como continuador de certas características matriciais da religiosidade popular ou do Catolicismo popular. Na condição de religião cristã, a principal continuidade do Pentecostalismo com a religiosidade popular brasileira consiste na crença em Jesus, demônios, milagres, mitos bíblicos, pecado, curas e intervenções sobrenaturais, feitiçarias, concepções escatológicas. Nesse sentido, geralmente também se ressalta o caráter leigo do Pentecostalismo, que permite ao fiel entrar em contato com Deus sem depender da mediação eclesiástica. Tais semelhanças e continuidades entre religiosidade popular e Pentecostalismo, sem dúvida, facilitam a evangelização e a socialização dos novos adeptos das igrejas pentecostais. O Islamismo, o Budismo e uma série de religiões não-cristãs não gozam dessas semelhanças e, por essa e por outras razões, enfrentam maiores dificuldades para crescer em solo nacional.

Como se pode observar abaixo, Willems (1967), Lalive D’Epinay (1970) e Frigerio (1998b) acentuam que o Pentecostalismo apresenta vários traços de continuidade cultural com a religiosidade popular, considerando-a uma das razões de seu sucesso no Brasil e na América Latina.

Emilio Willems ressalta que os missionários protestantes de certo modo tiveram o trabalho facilitado visto que palavras como redenção, alma imortal, graça, pecado, Cristo, cruz, Espírito Santo, céu e inferno eram familiares aos latino-americanos, que, tal como os protestantes do Norte, conheciam o decálogo, erigiam igrejas e adoravam coletivamente o Deus cristão. Willems defende a idéia de que as crenças do Catolicismo popular em experiências místicas, possessões, milagres, espíritos do mal, feiticeiras e demônios facilitaram a expansão do pentecostalismo, que, tal como o espiritismo e a umbanda, contribui [ainda hoje] para a preservação cultural de tais crenças (WILLEMS 1967: 5, 133-135).
Lalive d’Epinay destaca a aculturação do pentecostalismo à religiosidade popular, sua adaptação à mentalidade religiosa dos pobres chilenos e sua busca de inspiração na cultura popular, diante da qual mantém uma relação simultânea de negação e continuidade. Nesse sentido, ele chega até a indagar se o pentecostalismo não deveria ser interpretado “como uma reforma do Catolicismo popular em vez de uma renovação interna do Protestantismo” (D’EPINAY 1970: 118-121).
Na opinião de Alejandro Frigerio: “A aparente incongruência de apelar a práticas diferentes (santos católicos populares, umbanda, pentecostalismo), seja simultaneamente ou, mais provavelvemente, de maneira seqüencial, se torna mais compreensível se considerarmos as semelhanças mais que as diferenças entre ditas práticas, e sobretudo, os elementos comuns de todas elas com a religiosidade popular. A crescente expansão de igrejas pentecostais, templos umbandistas e agrupações que poderíamos situar dentro do movimento da Nova Era só pode ser entendida se considerarmos as similitudes que estas novas práticas têm com a religiosidade popular: a ubiqüidade da intervenção do sobrenatural na vida cotidiana das pessoas; a comunicação direta com a Divindade tanto durante os rituais como fora dos mesmos; a relação estreita e pessoal que se estabelece com ela, caracterizada pela proteção divina e o amor filial; a importância do emotivo e do afetivo nesta relação e além dela; a possibilidade de um papel ativo do fiel na propiciação de seus favores. (...) Haveria então, em maior medida do que se supõe, uma continuidade cultural entre a religiosidade popular latino-americana e estas religiões. Seu êxito se deveria a que expressam, fomentam e legitimam elementos da religiosidade popular que não encontravam lugar nas religiões instituídas. (...) podemos afirmar que grande parte do atrativo da doutrina de novos grupos religiosos (principalmente pentecostais e umbandistas) é que enfatizam e canalizam institucionalmente elementos da religiosidade popular” (FRIGERIO 1998b: 10-14).

A expansão da Igreja Universal reforçou a interpretação que enfatiza a continuidade entre Pentecostalismo e religiosidade popular. Pois, para tirar proveito evangelístico da mentalidade e do simbolismo religiosos brasileiros, sua liderança rearticula sincreticamente crenças, ritos e práticas das religiões concorrentes. Realiza sessão espiritual de descarrego, fechamento de corpo, corrente da mesa branca, retira encostos, desfaz mau-olhado, asperge nos fiéis galhos de arruda molhados em bacias com água benta e sal grosso, substitui fitas do Senhor do Bonfim por fitas com dizeres bíblicos, evangeliza em cemitérios durante Finados, oferece balas e doces aos adeptos no dia de Cosme e Damião. No caso da Universal, a continuidade não ocorre prioritariamente com o Catolicismo popular. Sarcástico, trecho abaixo de uma reportagem, ao descrever uma sessão de descarrego da Universal, fornece ideia e imagens da homologia existente entre certas crenças e práticas desta igreja e as da Umbanda, por exemplo.

Um homem todo de branco comanda o culto, cercado por pomba-giras, exus e pretos-velhos. Os auxiliares também se vestem do branco mais puro e acreditam nos poderes do sal grosso e do galho de arruda. Que religião é essa? Ihih, se vossuncê, respondeu umbanda, está errado, mizim fio. O culto – bata a cabeça – é da Igreja Universal do Reino de Deus. Saravá. A Sessão do Descarrego – esse é o nome propagado pela própria igreja – faz sucesso às terças-feiras, na Catedral da Fé, na Avenida Dom Helder Câmara, Del Castilho. É o momento, pregam os pastores, de retirar os encostos dos fiéis (O Dia online, 6.8.2001)[8].

Além do Pentecostalismo, outros movimentos religiosos apresentam certas continuidades com a religiosidade popular, caso da Umbanda e até da Nova Era (FRIGERIO 1998b: 10-14). Tal continuidade, portanto, não constitui prerrogativa do Pentecostalismo nem beneficia apenas ele.

Por outro lado, cabe observar a existência de sérias barreiras entre Pentecostalismo e religiosidade popular tradicional. Pois esta, tanto no período colonial como na primeira metade do Império, consiste fundamentalmente no Catolicismo popular e, em menor grau, nas crenças e práticas de origem africana e indígena. Além de prontamente demonizar as duas últimas, em especial os cultos afrobrasileiros, o Pentecostalismo brasileiro, seguindo pari passu o Protestantismo histórico, construiu sua identidade religiosa em radical oposição ao Catolicismo, seja o popular ou o oficial. Daí as severas críticas dos pentecostais de todos os quadrantes ao culto mariano (nomeado por eles de mariolatria), ao papado, à adoração de imagens e de santos e à reza do terço. O famoso “chute na santa”[9] confirmou a existência de tais barreiras religiosas, que não são intransponíveis, uma vez que o Pentecostalismo recruta a maioria de seus adeptos do Catolicismo. Ainda assim, alertam para o fato de que, se existe continuidade, também há barreiras entre eles. Mas não se pode negar que as afinidades apontadas facilitam o evangelismo pentecostal.

A principal dessas afinidades, enfatizam Willems e Frigerio, reside no fato de que a religiosidade popular em seu conjunto, tal como o Pentecostalismo, sempre foi acentuadamente mágica. No Período Colonial, o Catolicismo português em solo brasileiro, sob o regime de padroado e alheio às reformas tridentinas, fomentou um sem-número de crenças e práticas mágicas, que marcaram profundamente as tradições culturais do Brasil. Crenças e práticas mágicas continuam presentes no Catolicismo popular, mas deixaram de sofrer a perseguição romanizante ocorrida sobretudo na primeira República, tanto em razão de seu caráter antagônico à erudição teológica, ou à teologia romana, quanto de sua ambiguidade diante da autoridade clerical (DELLA CAVA 1975: 26). Atualmente, porém, as igrejas pentecostais assumiram o protagonismo na produção e oferta de crenças e serviços mágico-religiosos no país. Elas as produzem de forma sistemática, as divulgam por meios os mais diversos, inclusive midiáticos, e as ofertam diariamente em doses cavalares, visando atrair e recrutar crescente número de adeptos. E é justamente isso que faz com que milhões de brasileiros percorram diariamente igrejas pentecostais à procura de uma magia superior para organizar a vida, superar as dificuldades do cotidiano. Muitos agem assim não porque careçam necessariamente de outros meios e opções seculares, mas porque acreditam ou foram levados a crer que podem sanar seus problemas por meio da participação em rituais religiosos e do consumo de serviços mágicos.

A eficácia proselitista da oferta organizada de serviços mágicos

A história da Igreja Católica e, sobretudo, a do Protestantismo tipificam a crescente racionalização teológica das organizações religiosas e evidencia o processo pelo qual quanto mais a religião ética avança na modernidade mais a magia declina. Esse processo atingiu o ápice com o Protestantismo ascético. A Reforma protestante representou radical ruptura com os aspectos mágicos do Catolicismo medieval (WEBER 1983; BERGER 1985: 117-138), promovendo amplo desencantamento do mundo. No campo religioso, o Protestantismo se destacou no papel de promotor da secularização na Europa ocidental, combatendo crenças e práticas mágicas de origem católica ou pagã.

Em função da secularização do Estado e das instituições da sociedade moderna e do desencantamento e racionalização das próprias religiões cristãs, sociólogos, historiadores e teólogos nutriam a expectativa de que os grupos religiosos densamente mágicos, em vez de prosseguirem crescendo, se retraíssem, perdessem importância e passassem a discursar no vazio ou para interlocutores majoritariamente indiferentes. Esperava-se uma evolução constante no sentido da magia para a religião, a superação da primeira pela última, e não a persistência e muito menos o fortalecimento e a diversificação da magia. De modo algum previa-se que a expansão das religiões mais escancaradamente mágicas se desse à custa do enfraquecimento das instituições religiosas tradicionais e secularizadas, ou daquelas que, na teoria, tenderiam a se adaptar melhor à sociedade moderna. Já há algumas décadas, no entanto, percebeu-se que essa perspectiva teleológica antagonizava os fatos, tendo em vista a retração das religiões secularizadas e, inversamente, a expansão das religiões mágicas.

Embora, no Ocidente, as religiões mais secularizadas continuem a granjear mais respeito e a gozar de maior prestígio e legitimidade social que suas congêneres mágicas, elas cada vez mais perdem terreno para estas. Eis um dado inelutável da realidade do campo religioso contemporâneo: as religiões mágicas são as que mais se expandem na América Latina, na Europa e nos EUA (FRIGERIO 1998a). O sucesso numérico das religiões mágicas se deve, em parte, ao fato de que elas produzem e ofertam maior quantidade de serviços mágico-religiosos do que as religiões secularizadas. Com isso, conseguem atender melhor ou mais eficientemente aos interesses materiais e ideais dos estratos pobres da população.

O teólogo e monge católico Dom Estevão Bettencourt reconheceu a limitação do evangelismo católico romanizado: “Estamos perdendo católicos. Nossas missões evangelizadoras não estão sendo mais bem recebidas pelas famílias porque não podemos fazer milagres. (...) Nossa tarefa evangelizadora não pode prometer milagres e isso não satisfaz as pessoas”[10]. O descompasso católico em relação aos anseios das massas a deixa em desvantagem diante das igrejas pentecostais, especializadas na propaganda e prestação diuturnas de serviços mágico-religiosos. Com efeito, o Pentecostalismo tira grande proveito da longa tradição mágica da religiosidade popular brasileira e da fraqueza institucional da Igreja Católica, observada, por exemplo, pelo baixo número de padres e de vocações sacerdotais (WILLEMS 1967: 131; MARTIN 1990). Nas últimas duas décadas, o incentivo papal à Renovação Católica Carismática e o fim da repressão institucional ao Catolicismo popular visaram senão reverter, ao menos atenuar esse quadro, sem, no entanto, obter êxito em impedir o contínuo declínio católico e em frear a expansão pentecostal.

Desde sua origem, o Pentecostalismo se constituiu como herdeiro e seguidor de crenças, práticas e experiências religiosas do Cristianismo primitivo. Para tanto, apregoa que Deus age hoje como no passado bíblico. Isto é, cura enfermos, expulsa demônios, concede bênçãos e dons espirituais, faz milagres, intervém nos rumos da história e na vida cotidiana de seu rebanho. Daí a predileção dos líderes pentecostais pelo texto de Hebreus 13:8, que diz: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e o será para sempre”.

No início dos anos 70, Procopio Camargo (1973: 252) já dizia que a cura divina era um dos mais poderosos atrativos do Pentecostalismo. Com efeito, a oferta de cura, sobretudo quando acompanhada de testemunhos acerca de sua eficácia, funciona como excelente “isca” para atrair e fisgar novos adeptos. Pois, a cura é percebida como sinal inequívoco da atuação do poder divino (D’EPINAY 1970: 310). Da mesma forma, a ênfase nos dons espirituais – em especial nos de cura, profecia e discernimento de espíritos – e em experiências extáticas desempenham papel crucial no convencimento dos menos crédulos acerca dos poderes sobrenaturais de Cristo e do diabo. Tais crenças, práticas e experiências extracotidianas encerram tamanha força persuasiva porque conseguem, mais que qualquer citação bíblica ou argumento teológico, tornar plausíveis, aos olhos de fiéis e virtuais conversos, tanto a existência dessas entidades divinas e demoníacas quanto sua ação efetiva. Os que passaram por tais experiências extáticas dificilmente conseguem esquecê-las, ou negá-las, tendo em conta sua profundidade psíquica e o fato de que, nos cultos e testemunhos, elas continuam sendo rememoradas, confirmadas e revividas dia após dia.

Todas as vertentes pentecostais produzem e ofertam magia em profusão. Mesmo o culto da Congregação Cristã no Brasil – a igreja menos inclinada a efetuar concessões às massas com vista à superação da concorrência religiosa – “é dedicado quase na íntegra às necessidades pessoais e imediatas do indivíduo” (NELSON 1985: 125). Na defesa de seus interesses institucionais, diversas igrejas pentecostais procuram funcionar como prontos-socorros espirituais, prometendo a seus fiéis e virtuais adeptos uma mudança radical de vida, ou a salvação imediata de seus sofrimentos e infortúnios terrenos. Daí sua ênfase na realização de cultos, correntes e campanhas semanais para prosperidade, cura física e emocional, libertação de demônios, resolução de problemas familiares, afetivos, amorosos. No Pentecostalismo brasileiro, nenhuma igreja estabeleceu um sistema de magia tão bem elaborado e organizado como a Universal. Ela produz e oferece serviços mágico-religiosos de modo e em ritmo empresarial, agendando a ação divina, rotinizando a dispensação de bênçãos celestiais e fixando extensa programação diária de rituais destinados ao tratamento espiritual de infortúnios concretos e específicos.

A eficácia evangelística da oferta de solução mágico-religiosa para os infortúnios dos estratos pobres da população pode ser inferida dos dados do survey realizado por Fonseca (1997: 190), enquanto, em média, 39% dos evangélicos do Rio de Janeiro disseram enfrentar problemas que influenciaram sua conversão, no caso dos adeptos da Universal esse índice saltou para 63,9%. Da mesma forma, pesquisa do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS), efetuada nas cidades do Rio de Janeiro e Campinas, constatou que 67% dos que aderiram à Universal o fizeram motivados por algum problema específico, índice bem superior ao encontrado noutras igrejas evangélicas, nas quais a adesão associada à resolução de problemas ficou em 40% (Folha de S. Paulo, 22.10.95). A diferença de performance dessas igrejas não ocorre à toa. Resulta da eficiência do evangelismo eletrônico da Universal em atrair as pessoas aos cultos diários e, neles, de sua oferta sistemática e abundante de serviços mágico-religiosos adaptados aos interesses materiais, ideais e religiosos de parte considerável dos estratos pobres da população.

Como afirma Durkheim (1989), a magia tende a gerar compromissos efêmeros baseados numa relação de troca imediatista. Na tentativa de gerar compromissos religiosos estáveis e duradouros em meio à ampla clientela flutuante atraída pela oferta sistemática de serviços mágicos, a Universal realiza cultos de adoração ao Espírito Santo para os membros efetivos, discursa sobre o apocalipse e a volta de Cristo, associa salvação celestial com obediência bíblica (sobretudo em relação aos sacrifícios financeiros, exigências de fidelidade ao pagamento do dízimo e incessantes pedidos de ofertas), procurando persuadir os menos religiosamente engajados à conversão. A Deus é Amor, por sua vez, estabelece um rígido código de conduta ética, afastando os free-riders e a clientela descompromissada. No Pentecostalismo em geral, a oferta de magia constitui a principal isca para atrair pessoas à igreja, onde se tenta recrutá-las, socializá-las e, se possível, convertê-las. Uma vez dentro dos templos, contudo, os indivíduos em busca da resolução de seus problemas cotidianos logo se vêem às voltas com sessões de descarrego de encostos, cultos de libertação de demônios, louvor a Deus e adoração do Espírito Santo, cobrança de condutas éticas e de ofertas monetárias etc. É por meio desses ritos, práticas e cultos, que exprimem as doutrinas ou, em sentido mais amplo, a teodiceia de salvação dessas igrejas, que os pastores pentecostais conferem novos significados religiosos ao desemprego, à pobreza, à doença, à briga conjugal, à depressão, à solidão, à infelicidade, ao sofrimento e aos infortúnios em geral. Por meio disso, procuram estimular clientes e virtuais adeptos a estabelecer compromissos duradouros com seu grupo religioso. As taxas de crescimento da Universal comprovam que ela vem conseguindo transformar parte considerável de sua clientela flutuante em membro efetivo.

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Recebido: 15/10/2008
Aceite final: 20/11/2008

Notas

[*] Ricardo Mariano é doutor em sociologia pela USP e docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUC-RS

[1] O survey foi realizado com brasileiros acima de 16 anos.

[2] Para maiores informações sobre o perfil socioeconômico e o crescimento dos pentecostais, ver JACOB 2003: 39-69.

[3] Expandem-se igualmente as igrejas em célula, formadas pela multiplicação de pequenos grupos de fiéis, que funcionam em suas residências. As células constituem recurso importante para converter e manter adeptos. Mas têm impacto zero na mídia e na política partidária, espaços e poderes públicos crescentemente ocupados pelas grandes denominações pentecostais, geridas verticalmente.

[4] Sobre a Teologia da Prosperidade, ver Mariano (2003).

[5] As informações sobre a Congregação Cristã encontram-se nos documentos “Resumo da Convenção” e “Reuniões e Ensinamentos”, publicados pela administração da igreja, em maio de 1981, 7ª edição.

[6] A Quadrangular é administrada pelo Conselho Nacional de Diretores, composto por oito membros eleitos por pastores reunidos em convenção nacional e financiado por 5% da arrecadação das igrejas locais. Abaixo deste Conselho estão oito supervisores que lideram a denominação nos Estados, comandando o trabalho de mais de duas centenas de superintendentes de regiões eclesiásticas. O secretário-executivo, principal cargo administrativo e eclesiástico da igreja, tem mandato de quatro anos com direito à reeleição.

[7] A Deus é Amor permite que obreiras e Anas – Anas exercem funções de obreiras auxiliares nos cultos e têm como principal atribuição fazer orações a Deus – dirijam o culto semanal de senhoras. Elas podem exercer o papel de professoras da escola dominical.

[8] http//www.odia.ig.com.br/geral/ge060815.htm. Acesso em 7 ago. 2001.

[9] “Chute na santa” nomeia o episódio em que o bispo da Universal Sérgio Von Helde, em pleno feriado de Nossa Senhora de Aparecida, dia 12 de outubro de 1995, durante programa ao vivo da Rede Record, tocou com os pés e os punhos a imagem da santa, zombou de sua ineficácia e a nomeou de “boneco feio, horrível e desgraçado” (MARIANO 1999: 81-91).

[10] http//www.no.com.br, 10.9.2001, artigo O Rio descrente, de Daniele Lua. Acesso em 9 set. 2005.